segunda-feira, 23 de novembro de 2009

JOSÉ ALTINO: a Xilogravura no computador!



JOSÉ ALTINO: a Xilogravura no computador!

(Pedro Osmar). 14.08.2009.



A questão é a seguinte: o computador bem que engoliu José Altino como bem quis, mas vomitou! Sol do Bute, esse menino de João Pessoa vem passando pela “lixa” maquinal da realidade resistindo bravamente com sua inteligência animalesca de meia-voz, meia luz, meio do caminho, para irromper silenciosamente num SOL DO BUTE de rachar a “cabeça com pássaros” desses dias tempestivos, por cima de pau (cedro, loro vermelho, peroba, canela) e pedra (quase lito), empunhando e imprimindo seu artesanato de simplicidade chocante, em madeira talhada com impressões que falam e descrevem uma realidade oscilante que não foi ele quem criou, mas que ajuda a refletir e na medida do possível mudar, com o que sabe fazer de melhor: contar suas histórias de “príncipes e princesas do miramar” para quem ainda não se deixou seduzir e se consumir pela televisão alada das (i) realidades.

Televisão e computador como os bichos-papão de uma época que nos devora e vomita e mija e caga em seus artesanatos e broqueis (brocados de um barroquismo que só quer ser bauhaus), engolindo seus nós cegos, seus egos dilacerantes e dilacerados de bisturi elétrico, a aceitar de bom grado o que vem de figuras humanizadas e brilhantes como José Altino por essas estradas afora. E tão pensando que Altino tem medo dessas pabulagens e mungangas? O menino empunha com força seus “intrumentos de trabalho e diálogo” com a madeira (goifas, formão, faquinha artesanal) como um são jorge diaraque espantando seus dragões luminosos de todo dia. Xilogravuras e Infogravuras a declarar: sangue de idéias que jorram essa gravidez criativa...e aí, porque não?

Compreender a importância de todo este projeto/processo profissional libertador na atualidade é imprescindível para as novas gerações. Até por que elas precisam saber qual é a onda! Verdadeiros mestres circulam hoje por esses novos mídias que a atualidade abre e fecha e reabre e refecha, descrevendo um projeto político que coloca a arte de pessoas como José Altino em sintonia com o mundo contemporâneo, em tudo que ele tem de belo e feio, faces da mesma moeda que alguns custam tanto a ganhar...

Aprendi ao longo destes últimos trinta anos que um fio bem tênue separa as duas realidades: a da madeira esfaqueada, madeira cortada, arranhada, madeira entintada, gerando gravuras de papel (a arte de papel servindo de suporte de uma arte pobre a decorar as capas dos folhetos de cordel pelo mundo inteiro), e o computador e sua infogravura de imagens superficiais (servindo de suporte de uma arte rica e milionária a decorar escritórios e museus vitorianos). Essa luta inglória serve de parâmetro aos que se dispõem a entender a arte de artistas como José Altino, bem como de seu aluno mais famoso, o também paraibano (de uiraúna) Ciro Fernandes, com quem tive o prazer de trocar idéias em tardes cariocas nos anos 80/90.

E isso vai criando uma série de janelas que vão se abrindo aos golpes desse vai-e-vem mercadológico que ninguém sabe para onde vai... Mas nós aquí sabemos muito bem para onde vamos: com o Clube da Gravura da Paraíba em que se destaca a figura de outro grande mestre, o pintor, animador cultural e xilogravador Unhandeijara Lisboa, o Nandy Lisboa, presidente do Clube da Gravur, uma escola fundamental para xilogravadores da nova geração.

Xilo, Lito, Serigrafia, Carimbo, Infogravura, Pirogravura, projetos que vem servindo para marcar com inteligência a história social da humanidade, artesanal e industrial, para revelar verdadeiros mestres em várias partes do mundo e aquí, bem pertinho, nesse mundo de nossas potencialidades de arte e consumo, existirmos. O nordeste e a Paraíba tem suas genialidades a declarar, e José Altino é uma dessas figuras que balizam e sinalizam parte essas carnavalizações industriais com que nos defrontamos por esses dias de mercado de arte que só servem às elites (e as elites servem à quem? E para que?). A resposta dele foi e será sempre o rico e livre artesanato de suas gravuras vendidas ao preço de sua sobrevivência, com a dignidade do artista que sai todo dia para encarar um mercado dos amigos que compram seus produtos, seja uma camiseta com suas imagens fantasiosas, ou suas gravuras de xilo.

Quem quiser vê-lo trabalhando e comercializando seus produtos basta visitar o seu ateliê em miramar (será ele o próprio príncipe do miramar?) para ter uma idéia de quem é esse cara que um dia, lá pelos anos 70, me encantou com seu livreto de gravuras O SOL DO BUTE. A arte visual da Paraíba tem muito a ver com sua arte, até porque ele hoje decora as ruas de João Pessoa com suas cabeças-pássaros, de forma bem curiosa, projeto de alguma agencia de publicidade mais ligada no futuro. Quem terá tido essa idéia?

(Pedro Osmar é artista multimídia paraibano).